O trato de o que se entende por patrimônio, seja cultural ou natural, tem sido objeto, há séculos, de importantes transformações e permanências, de diferentes perspectivas e, não raro, de calorosos debates.
Não obstante, é possível se reconhecer um conjunto de entendimentos teóricos e empíricos que predomina em nossa contemporaneidade e que tem sido adotado, no todo ou em parte, na concepção de um número crescente de políticas, planos, programas e projetos de conservação de bens patrimoniais em geral e, em específico, da preservação e uso sustentável de paisagens culturais, sítios urbanos tombados, bens arquitetônicos, bens integrados e móveis, sítios arqueológicos, lugares de práticas culturais coletivas e unidades de conservação da natureza.
Esse conjunto de entendimentos é adotado, também, como premissas e diretrizes do portal Patrimônios Culturais e Naturais: Olhares, Imagens, Palavras, Conservação© – e é sumarizado a seguir, conforme o temos sistematizado, transmitido e aplicado em diversas produções bibliográficas, técnicas e artísticas.
1. Da determinação de o que é patrimônio e de como o conservar
Em sociedades que têm como prática social o acautelamento de espaços, objetos e manifestações que consideram como portadores de valores relevantes – e aos quais a tradição neolatina denomina “bens patrimoniais” – tanto a determinação desses bens quanto a determinação de como conservá-los são processos que compartilham, via de regra, três aspectos notáveis.
Primeiro, a determinação e conservação de bens culturais, em sua totalidade, e a determinação e conservação de bens naturais, em grande medida, são processos essencialmente axiológicos – são juízos de valor –, a despeito de qualquer esforço para dotá-los de pura objetividade e por mais que eles se apoiem, eventualmente, em ciências de base cartesiana. Segundo, esses processos têm variadas motivações políticas e são adotados amiúde como, inclusive, expedientes para justificar ou forjar a coesão social e territorial de uma sociedade. Terceiro, esses processos têm grande potencial de impacto na produção do espaço e reprodução social, nos valores de uso e de troca dos bens e de seus contextos socioespaciais e, por conseguinte, na continuidade ou não do que é alçado a patrimônio e do que não é.
Portanto, os processos de determinação e de conservação de bens patrimoniais devem ser objetos de rigorosa análise, crítica e ponderação, em termos dos valores e critérios adotados, dos grupos e interesses envolvidos, de suas motivações, dos impactos potenciais e, em especial, dos modos de deliberação. Esses modos devem ser efetivamente democráticos e caracterizados, por óbvio, pela participação de todos que têm relação com a conservação dos bens, pelo protagonismo das comunidades diretamente relacionadas a eles e pela adoção de entendimentos sobre cultura, natureza e patrimônio mais inclusivos e afeitos à valorização da diversidade.
2. Do conceito antropológico de cultura (e natureza)
Uma marca distintiva de nosso tempo consiste na profunda revisão pela qual estão a passar longevos entendimentos das sociedades urbano-industriais acerca do que é natureza, do que é cultura e, sobretudo, de suas relações. Essa revolução filosófica – cuja abrangência e efeitos nas percepções e valores humanos nos parecem os mais amplos e profundos desde o lançamento das bases da filosofia moderna por René Descartes (1596-1650) – é fruto de uma miríade de fatores objetivos e subjetivos e tem acarretado relevantes transformações nos modos de produção do espaço e reprodução social de tais sociedades.
No que tange ao entendimento acerca do que é natureza, muitos dos protagonistas dessa revolução filosófica, como o Ambientalismo e o Culturalismo, têm demonstrado que seu significado não é universal, mas determinado pelos valores, sentidos, concepções e saberes de cada cultura. Mais ainda, eles têm evidenciado que a cultura determina as relações com o que entende por natureza – e se são sustentáveis ou não – e, por decorrência, têm animado a progressiva superação da reducionista noção cartesiana, tratada adiante, em nome de se conceituar a cultura em consonância com sua abrangência e potência etimológicas originais[1] e conforme preconizam as Ciências Humanas em geral e, em específico, a Antropologia. Ou seja, como:
um sistema, essencialmente dinâmico, de produção e reprodução do conjunto de valores, sentidos, concepções, saberes, símbolos, linguagens, práticas e obras que é próprio a cada grupo e ser humano, que estrutura sua existência e que determina, inclusive, o que ele entende por real” (Tofani, 2020, p.4).
A cultura, assim entendida, consiste no mais poderoso sistema de significação de um grupo ou ser social, em um dado tempo, determina seus modos de produção do espaço e reprodução social, e pode ser tomada como a representação mais completa de suas relações consigo e com o outro, com o que denomina como natureza e com o que entende como suas divindades. A cultura é expressão plena do ser humano e seu fundamento ontológico por excelência.
Contudo, é patente a resiliência da reducionista noção cartesiana de cultura, não apenas entre leigos e na esfera privada, mas também entre estudiosos e na esfera pública. Essa noção parece ter raízes em limites conceituais e operacionais do cartesianismo e consiste em um entendimento constituído por exclusão ou por exceção, uma vez que abrange praticamente todas as dimensões da existência humana de que não deu conta o afã cartesiano por verdades neutras, objetivas, cumulativas e universais. Assim sendo, o que se entende como cultura nessa tradição é simplesmente um espaço onde se confina compulsoriamente tudo que se supõe subjetivo, imponderável ou idiossincrático, tal como as manifestações artísticas, folclóricas, mitológicas e religiosas que são objetos da maioria dos ministérios da cultura, secretarias de cultura, diretorias de assuntos culturais e congêneres, no Brasil e além.
No âmbito patrimonial, as significativas diferenças entre as concepções cartesiana e antropológica de cultura redundam em critérios de determinação de bens patrimoniais igualmente diferentes. Por conseguinte, os acervos constituídos sob a égide de cada uma dessas racionalidades são também bastante diferentes, tanto em termos qualitativos quanto em termos quantitativos, assim como o alcance da valorização e proteção da diversidade, tanto cultural quanto natural. Em outras palavras, enquanto a concepção cartesiana tende a acautelar apenas monumentos da história oficial e obras de arte que entende como excepcionais, a concepção antropológica tende a contemplar bens relacionados a cada e a todos os grupos participantes na formação e composição da respectiva sociedade, aí incluídos bens a que se denomina como “culturais materiais” ou “culturais tangíveis”, como “culturais imateriais” ou “culturais intangíveis”, e como “naturais”.
[1] A palavra “cultura” tem origens que remontam ao verbo latino colo, que significa “cultivar, habitar, morar, cuidar, preparar, proteger, amar, estimar, cuidar de, exercer, praticar, honrar, respeitar, venerar, adorar” (FIRMINO, 1950c., p.106). O verbo colo, juntamente com seu particípio passado cultus e seu particípio futuro culturus, referem-se, portanto, ao conjunto de atos e efeitos mais essenciais à existência humana, no presente, no passado e no futuro – ou seja, continuamente (Tofani, 2008).
3. Do espaço enquanto base existencial e de sua compreensão
O espaço, por si só, é mero conteúdo e/ou continente de coisas, desprovido de qualquer significado e carente de realidade – pois o que ser humano entende como real é tão somente “aquilo que o olhar, enquanto sistema de significação culturalmente determinado, retira do limbo do inexistente, do inominado, e pela palavra dá ao mundo sensível, ao existencial.” (Tofani, 2021, p. 196). Para aquém desse ato fundante da realidade, nada existe.
Este entendimento, de viés assumidamente fenomenológico, permite afirmar, inclusive, que não existe uma natureza natural, uma vez que o ato de nominar algo como “natureza” ou “natural” o culturaliza de imediato; uma vez que o significado de “natureza” não é universal, mas culturalmente referenciado; uma vez que a palavra “natureza” sequer existe em sociedades cujas cosmologias não se baseiam na dicotomia cultura-natureza que caracteriza sociedades urbano-industriais. Sendo assim, tanto a natureza quanto qualquer objeto concreto ou abstrato que é designado por uma palavra são, em essência, um constructo cultural. Ou como ensinou Riobaldo, herói trágico de Guimarães Rosa, em uma de seus mais sensíveis máximas: “Sertão: é dentro da gente.” (Rosa, 2001, p. 325).
Nesse sentido, um espaço é considerado base existencial quando lhe é atribuído um valor, sentido ou concepção fundamental para um grupo ou ser humano – como uma cordilheira tida como morada de deuses ou um deserto tido como morada de demônios. Ele também é base existencial quando suporta uma prática social ou individual essencial – como um território de caça e coleta em uma floresta ombrófila ou um pesqueiro tradicional em uma formação recifal. E também o é, por óbvio, quando sua materialidade é transformada pela mão humana, quando esse espaço é alçado à obra da cultura, por meio de saberes, símbolos e linguagens, de modo a abrigar práticas e com vistas a concretizar valores, sentidos e concepções – como uma casa ou uma cidade que se produz e reproduz.
Ao produzir espaço enquanto base existencial, o ser humano constrói um lugar onde crê ser possível a consumação de sua existência física e, mais, um lugar onde suas verdades estão concretizadas na matéria, onde ele possa ver sentido nas origens e trajetórias de seus antepassados, onde ele possa vislumbrar um destino e uma trajetória para seus descendentes, onde ele pode experimentar sua vida como significativa, onde ele pode verdadeiramente habitar.
Ao concretizar e vivenciar valores, sentidos e concepções no espaço, o ser humano deposita nesse espaço algo de si, a ele dando vida, nele se refletindo, com ele se identificando, a ele pertencendo. Assim, as coisas da natureza tornam-se coisas da cultura; assim, a pedra e a cal, o barro e a madeira, o aço e o vidro transcendem sua mera materialidade e são capazes de falar daqueles que as tocaram e transformaram; assim podemos “reconstruir no deserto o paraíso perdido” (Tofani, 2008, p.25).
A produção de um espaço enquanto base existencial é um ato essencialmente criativo – e a compreensão desse espaço exige o conhecimento, tanto ou mais do que de sua materialidade, das práticas que abriga, dos valores, sentidos e concepções que concretiza, e dos saberes, símbolos e linguagens adotados para tanto.
Portanto, a compreensão de uma Paisagem Cultural, um Sítio Urbano Tombado, um Bem Arquitetônico, um Sítio Arqueológico, um Lugar de práticas culturais coletivas, ou uma Unidade de Conservação de categorias como Monumento Natural, Reserva Extrativista etc. – exige conhecer seus atributos físicos e simbólicos, suas motivações objetivas e subjetivas e seus processos de produção. Esses atributos, motivações e processos devem ser sempre identificados, documentados, analisados, salvaguardados e, quando for o caso, restaurados, reabilitados e/ou requalificados.
4. Da interdependência e indissociabilidade entre bens patrimoniais
A expressão “produção do espaço e reprodução social” – necessariamente indivisa e dialógica e tão cara a diversos campos do conhecimento – reconhece a relação de interdependência ou indissociabilidade que há entre esses dois atos e efeitos fundamentais para a existência humana. Ou seja, a produção do espaço (entendida em seus sentidos objetivos e subjetivos e em suas dimensões naturais e culturais) é, a um só tempo, causa e consequência da reprodução social e, concomitantemente, a reprodução social (também entendida em seus sentidos objetivos e subjetivos e em suas dimensões naturais e culturais) é, a um só tempo, consequência e causa da produção do espaço.
Nesse sentido, tal expressão entende como espaço produzido não apenas aquele que tem sua materialidade original bastante transformada por mãos humanas – como as cidades e arquiteturas. Ela também entende como espaço produzido aquele que, mesmo tendo sua materialidade pouco ou nada transformada, é lugar ou território de ato ou efeito, objetivo ou subjetivo, necessário à reprodução de um grupo social – como o território de caça e coleta e o pesqueiro tradicional mencionados antes, bem como a cordilheira tida como morada de deuses e deserto tido como morada de demônios.
Portanto, todos os espaços, objetos e manifestações alçados a bem patrimonial têm relações de interdependência e/ou indissociabilidade entre si e com outros espaços, objetos e/ou manifestações do respectivo grupo social – ou tinham, antes que elas fossem rompidas por algum fenômeno desagregador. Essas relações se dão tanto entre bens classificados como “culturais materiais” e “culturais imateriais” quanto entre bens classificados como “culturais” e “naturais”. Ademais, elas são patentes principalmente em comunidades tradicionais, em virtude de terem como característica marcante a dependência e conhecimento profundos das dimensões naturais de seus territórios. Isso redunda em um elaborado conjunto de estratégias de manejo dos recursos naturais, em modos de produção do espaço e reprodução social peculiares, e em percepções e representações profundamente marcadas por tal dependência e conhecimento.
Em face disto, o acautelamento de algo – seja rotulado como “bem cultural material”, “bem cultural imaterial”, “bem natural” ou o que seja – exige a observância dessas relações, requer o reconhecimento dos valores sociais atribuídos ao bem e, eventualmente, impõe tanto o acautelamento de outros espaços, objetos e/ou manifestações que protagonizam essas relações quanto a sua conservação integrada. Caso contrário, a própria patrimonialização pode, paradoxalmente, desempenhar o papel de fenômeno desagregador referido acima, pois seu esforço pela salvaguarda do bem pode redundar, inadvertidamente, na supressão de seus papeis e valores sociais tradicionais, na perda de seu sentido na produção do espaço e reprodução social tradicionais e, por conseguinte, na sua extinção.
As relações de interdependência e indissociabilidade entre bens patrimoniais exigem, portanto, a integração da conservação dos bens culturais materiais e imateriais, assim como da conservação dos bens culturais e naturais. Por todo o mundo, avançam a observância dessas relações, o reconhecimento de suas especificidades, o acautelamento sistêmico e a conservação integrada. Já no Brasil, esses avanços têm como expressões por excelência: os bens tombados como Paisagem Cultural, ou seja, “uma porção peculiar do território nacional, representativa do processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores” (nos termos da Portaria 127/2009 do IPHAN, que institui a chancela da Paisagem Cultural); os bens registrados como Lugares, a exemplo de “mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas” (nos termos do Decreto 3.551/2000, que institui o registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial); e os bens acautelados como Reservas Extrativistas, pois consistem em “área utilizada por populações extrativistas tradicionais” onde se deve “proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade” (nos termos da Lei 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza).
Contudo, não obstante tais avanços rumo ao reconhecimento e valorização das relações de interdependência e indissociabilidade entre bens patrimoniais, ainda preponderam em nosso país os mitos da natureza intocada e matas virgens, os mitos da imaterialidade e intangibilidade, as abordagens meramente disciplinares e os fetiches taxonômicos, não apenas em meio à maioria dos leigos, mas também entre muitos estudiosos e organizações de patrimônio. Tudo isso a despeito da evidência de tais relações de interdependência ou indissociabilidade e com grave prejuízo à compreensão e conservação de nossos bens patrimoniais culturais e naturais.
5. Da conservação enquanto preservação e uso sustentável
A conservação de bens patrimoniais exige a salvaguarda da integridade de seus principais atributos físicos e simbólicos contra fenômenos antrópicos e naturais potencialmente lesivos e – a um só tempo e de maneira sustentável – a destinação desses bens a finalidades que os permitam contribuir para o desenvolvimento social em geral e, em específico, para o desenvolvimento das comunidades às quais eles estão diretamente associados.
Este entendimento se deve ao fato de que a sustentabilidade da relação entre salvaguarda e destinação de um bem patrimonial – ou, em termos mais específicos, a sua preservação e uso sustentável – consiste na melhor garantia de que o bem será sempre entendido como de grande relevância e permanentemente conservado pela respectiva sociedade, pois ocupa um lugar privilegiado não apenas em sua história e memória (seu passado), mas também na consumação de sua existência hoje (seu presente) e, por extensão, em seus principais projetos para o porvir (seu futuro).
Todavia, alcançar a sustentabilidade nessa relação – estruturalmente dinâmica e delicada – consiste em uma tarefa de grande complexidade, que impõe, entre outros cuidados, a constante observância de, por um lado, a tendência da preservação à permanência (e a acarretar eventuais prejuízos ao desenvolvimento social) e, por outro lado, a tendência do uso à transformação (e a acarretar eventuais prejuízos à integridade dos principais atributos do bem). Isso impõe tanto a obrigatoriedade de se dar uma finalidade ao bem patrimonial que seja compatível com tais atributos quanto, em muitos casos, exige que o bem seja objeto de intervenções socioespaciais que o adequem a essa finalidade e, por óbvio, que não lesem tais atributos.
6. Das comunidades depositárias ou guardiãs e seu papel capital na conservação
Conforme determina o Artigo 216 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, “o Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação”. Esses instrumentos são pautados pelo conceito de função social da propriedade – que não suprime o direito a ela, mas limita sua utilização em função do interesse coletivo – e criam a figura do compartilhamento de responsabilidade pelos bens culturais entre o Poder Público e as comunidades diretamente relacionadas a eles. Estas comunidades são denominadas “depositárias” ou “guardiãs” por muitos estudiosos e organizações dedicadas à conservação do patrimônio, pois recebem em depósito tais bens e são entendidas como sendo seus principais guardiões.
As comunidades depositárias ou guardiãs de bens patrimoniais e, em particular, seus proprietários, locatários, cessionários, produtores e usuários desempenham um papel capital na sua conservação e, em específico, na sua preservação e uso sustentável, pois são, em geral, os atores sociais com relações mais constantes com os bens – quando não são uma condição precípua para sua existência.
No entanto, se o papel desempenhado por essas comunidades na conservação tende a ser altamente positivo quando ela é compatível com seus valores e modos de produção do espaço e reprodução social, ocorre o oposto quando a conservação é incompatível. Ou seja, modos de conservação que causam alterações estruturais nas relações tradicionais das comunidades com um espaço, objeto ou manifestação que é alçado à patrimônio, podem provocar a perda de seu sentido para as comunidades e acarretar seu abandono ou, mesmo, sua destruição.
Contudo, o que consideramos mais grave na relação entre comunidades depositárias ou guardiãs e conservação patrimonial consiste no fenômeno da expulsão econômica que comumente assola comunidades tradicionais vivendo em espaços que, uma vez valorizados por sua patrimonialização, passam a ser objeto de grande interesse por parte de, sobretudo, modalidades de turismo receptivo de base não local. Esse fenômeno é causado pela funesta associação entre, pelo menos, três fatores: primeiro, o grande aumento dos valores de bens, serviços, taxas e impostos praticados nesses espaços, notadamente quando padecem de uma base econômica frágil e sem diversificação; segundo, a incessante pressão de compra dos imóveis das famílias tradicionais nesses espaços, exercida por atores externos mais abastados; terceiro, a virtual impossibilidade de essas famílias ampliarem suas rendas em patamares proporcionais ou superiores aos dos referidos aumentos de bens, serviços, taxas e impostos praticados nesses espaços, devido ao fato de sua baixa escolaridade e qualificação profissional lhes possibilitarem apenas oportunidades e postos de trabalho com baixa exigência, com baixos salários e sazonais. Enfim, mesmo com a inserção no setor do turismo, essas comunidades tradicionais dificilmente experimentam uma melhoria de padrão econômico correspondente ao aumento do custo de vida local e, assim sendo, até as famílias que tendem a resistir à pressão imobiliária acabam por vender suas propriedades para os referidos atores externos mais abastados e por serem substituídas por eles nos espaços tradicionais.
Esse fenômeno tem afetado comunidades tradicionais em todo o mundo e, citando apenas alguns de seus nefastos desdobramentos, tem acarretado o desmantelamento social dessas comunidades, a extinção de suas manifestações culturais com relações de interdependência ou indissociabilidade com espaços tradicionais e, por fim, a cenarização desses espaços. Ou seja, a adulteração da espacialidade, materialidade, uso e ocupação de seus bens culturais edificados em nome da produção e reprodução de valores, sentidos, concepções, saberes, símbolos, linguagens, práticas e obras que, a despeito de padecerem de pouca ou nenhuma autenticidade histórica e cultural, são consumidos vorazmente por alguns segmentos turísticos (Tofani, 1997, 2004, 2008).
Portanto, a conservação de bens patrimoniais exige, além de sólidos conhecimentos sobre os atributos dos bens, a compreensão dos modos de produção do espaço e reprodução social das comunidades depositárias ou guardiãs; o reconhecimento de suas demandas; o comprometimento com sua manutenção em seus territórios tradicionais; processos decisórios que garantam seu efetivo protagonismo; e, sempre que necessário, seu efetivo empoderamento para lidar com as eventuais transformações e oportunidades advindas do par patrimonialização-turismo.
7. Do acesso a bens patrimoniais enquanto compreensão, vivência e conservação
Como bem sabem os estudiosos e organizações dedicadas à conservação do patrimônio tanto cultural quanto natural, “só conservamos o que nos é significativo e, para algo ser significativo, é necessário que seja compreendido e, sempre que possível, vivenciado” (Tofani, 2020, p. 10). Esta máxima evidencia uma condição basilar da conservação – ou seja, que quanto maiores forem a compreensão e a vivência de um bem patrimonial, maiores serão seu valor social e a ação política por sua perpetuação – e impõe que se proporcione acesso qualificado ao bem tanto pelas respectivas sociedades quanto por todos que possam contribuir, direta ou indiretamente, para sua conservação.
Isso pode ser proporcionado por meio de duas categorias de acesso que, não obstante sua relativa autonomia, alcançam melhores resultados quando experimentadas conjuntamente. A primeira categoria, que denominamos acesso abstrato, consiste em publicações e mídias voltadas a diferentes públicos, oferecidas em diversos formatos e contendo informações que possibilitem a compreensão de todos os atributos do bem ou, pelo menos, de seus principais. A segunda categoria, que denominamos acesso concreto, consiste em infraestruturas e serviços que possibilitem, também a diferentes públicos, a vivência do bem ou, pelo menos, de suas dimensões públicas. O acesso concreto deve primar pela sustentabilidade, limitar-se à capacidade de carga do bem e, se for o caso, ser franqueado apenas à respectiva comunidade depositária ou guardiã.
Portanto, em se tratando de acervos patrimoniais constituídos por uma grande diversidade de bens, com elevada interdependência e/ou indissociabilidade, a dotação de acesso geralmente resulta, no que tange ao acesso abstrato, em publicações e mídias interdisciplinares por excelência e, no que tange ao acesso concreto, em redes de infraestruturas e serviços que podem ter considerável diversidade de elementos e extensão geográfica – à maneira, por exemplo, de um número crescente de “museus de território” no Brasil e no exterior.
8. Da complexidade e interdisciplinaridade da conservação
Alcançar sustentabilidade na relação estruturalmente dinâmica e delicada entre a preservação e o uso de bens patrimoniais consiste em uma tarefa assaz complexa devido, principalmente, à grande variedade e variabilidade de fatores envolvidos. Isso inclui: os atributos físicos e simbólicos do bem; os valores conferidos a ele; as motivações de sua conservação; as características e demandas das comunidades depositárias ou guardiãs; os interesses de outros atores sociais relacionados aos bens; os diversos entendimentos sobre patrimônio e as variadas teorias e práticas de conservação; as legislações e normas aplicáveis; os modos e instâncias de deliberação; as dimensões funcionais, tecnológicas e simbólicas próprias a qualquer espaço edificado e sua produção; os impactos na produção do espaço e reprodução social; e, até mesmo, fatores como as mudanças climáticas globais.
Como se não bastasse, a busca por sustentabilidade ganha contornos ainda mais intrincados quando os bens patrimoniais se encontram em contextos caracterizados por prolongado declínio econômico ou acelerado crescimento econômico; grande desigualdade social e política; pressões e danos de modalidades predatórias de mineração, industrialização, urbanização, turismo etc.; estatutos legais e normativos inadequados para o trato patrimonial; e abordagens meramente disciplinares, a despeito da natureza interdisciplinar da conservação e em prejuízo tanto do desenvolvimento de atitudes e arcabouços teórico-metodológicos interdisciplinares quanto dos próprios bens patrimoniais.
Como é próprio à ideia de sustentabilidade, a preservação e uso sustentável do patrimônio cultural e natural consiste em um processo permanente que depende, antes de tudo, de sociedades comprometidas com os valores democráticos e os valores de sustentabilidade social, econômica e ambiental preconizados, por exemplo, pela Organização das Nações Unidas, por meio de seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ONU, 2015). Esse processo requer a adoção de uma visão em longo prazo, assim como de arcabouços teórico-metodológicos capazes de pautar efetivamente as complexas atividades de planejamento e gestão da conservação, de produção e implantação de planos de preservação e uso sustentável e, eventualmente, de elaboração e execução de projetos de intervenções com vistas à restauração, reabilitação e/ou requalificação dos bens patrimoniais.
Portanto, a preservação e uso sustentável do patrimônio cultural e natural exige conhecimentos, habilidades e competências de conservação disciplinares e, sobretudo, atitudes, arcabouços teórico-metodológicos e processos de conservação interdisciplinares. Todavia, deve-se lembrar que a interdisciplinaridade não consiste em uma mera soma de esforços disciplinares, e que tal soma dificilmente resulta, por si só, na preservação e uso sustentável do patrimônio.
A interdisciplinaridade exige, isto sim, que as disciplinas envolvidas compartilhem uma base teórico-metodológica que possibilite a integração da geração, desenvolvimento, transmissão e aplicação de conhecimentos, habilidades e competências. Essa base consiste nos principais entendimentos advindos das teorias e práticas da conservação – um conjunto interdisciplinar por excelência, que não há como ser reivindicado, legitimamente, como exclusividade de qualquer disciplina (Tofani, 2020, p. 12).
Por fim, todos atores da conservação do patrimônio cultural – e particularmente aqueles tidos como especialistas – devem atentar para uma dimensão fundamental desses processos, assim destacada por Salvador Muñoz Viñas (2003):
No propone una nueva forma de tecnocracia ilustrada ni de democracia asamblearia, sino más bien una democracia gestionada por representantes social y profesionalmente cualificados, que intenten aplicar los criterios de negociación y sustentabilidad. Las decisiones corresponden a los expertos, pero éstos deben ser conscientes de para quién trabajan y de donde proviene su autoridad sobre el patrimonio. La autoridad del experto deriva de su condición de usuario privilegiado, de usuario que vive de y para el patrimonio, que lo ha estudiado, lo conoce y lo aprecia de manera especialmente intensa; pero sobre todo de su capacidad para “contar historias convincentes” (Leigh et al., 1994): es decir, de la autoridad que los demás usuarios le conceden (Muñoz Viñas, 2003, p.173).
9. Das intervenções em bens patrimoniais
A destinação de bens patrimoniais a finalidades que os permitam contribuir para o desenvolvimento social requer, na maioria das vezes, adequações em sua espacialidade, materialidade e/ou infraestrutura. Essas devem ser realizadas de maneira criteriosa, de modo a não causarem danos nos principais atributos físicos e simbólicos dos bens e em conformidade com as principais teorias e práticas contemporâneas de conservação e, particularmente, das categorias de intervenção denominadas restauração, reabilitação e requalificação.
Dentre essas três categorias, a restauração figura como a mais antiga e conhecida, não obstante ser objeto de notável variação conceitual e considerável polêmica, desde pelo menos o século XIX. Tal variação conceitual está relacionada fundamentalmente às transformações e permanências dos próprios conceitos de patrimônio e de conservação e, em particular, de autenticidade e de integridade. Não obstante o embate entre diferentes conceitos de restauração ser uma constante histórica – e a despeito da resiliência da longeva acepção de restauração enquanto toda e qualquer intervenção conservativa na matéria de um bem cultural – pode-se afirmar que predomina hoje o entendimento de que ela consiste em:
o processo de contribuir para a conservação de um bem por meio do restabelecimento de sua matéria a um estado anterior conhecido. A restauração deve terminar quando começa a hipótese, pois se rejeita intervenções conjecturais, e ter caráter excepcional, pois se deve priorizar a manutenção do bem (Tofani, 2020, p. 22).
Esse entendimento resulta de uma longa série de fatores tanto históricos e sociais quanto teóricos e práticos, que inclui a necessidade de se tratar o rápido crescimento global das intervenções em bens do patrimônio cultural edificado não mais como restaurações em geral, mas como categorias de intervenção específicas, com acepções e escopos específicos, e com teorias e práticas específicas. A maioria dessas categorias é determinada pelas especificidades de seus objetos e objetivos e adota em suas denominações um termo referente a eles, antecedido do prefixo latino re, seja por filiação à restauração, seja por mero modismo. Nesse ambiente de diversificação e especialização, duas categorias de intervenção têm se destacado por sua crescente consistência epistemológica, e mesmo etimológica: a reabilitação e a requalificação. Conforme se depreende de muitos estudos de caso,
a reabilitação e a requalificação têm em comum, geralmente, o fato de serem processos que visam contribuir para a preservação e uso sustentável de bens culturais edificados considerados em situação de subutilização, deterioração ou degradação social – por meio de criteriosa adequação de seus atributos espaciais, materiais e/ou infraestruturais às finalidades pretendidas, podendo implicar ou não a adição e subtração de espaços, materiais e/ou infraestruturas e, por óbvio, sem causar prejuízos à integridade dos principais atributos físicos e simbólicos do bem. No entanto, essas duas categorias têm em diferente o fato de que enquanto a reabilitação consiste em um processo com ênfase no uso do bem – e que implica uma resoluta potencialização do uso atual ou restabelecimento e potencialização de um uso anterior – a requalificação consiste em um processo com ênfase nos atributos do bem – e que implica uma resoluta alteração dos atributos objetivos e/ou subjetivos e, não raro, de seu uso. Ademais, a reabilitação e a requalificação, bem como a restauração podem estar presentes, em variadas medidas, em uma mesma intervenção, especialmente em bens edificados de maior extensão e complexidade, uma vez que essas três categorias frequentemente se completam, quando não se sobrepõem parcialmente (Tofani, 2020, p. 22-23).
As teorias e práticas de restauração, reabilitação e requalificação em bens culturais edificados, enquanto resultado das transformações e permanências dos conceitos de cultura e patrimônio e de autenticidade e integridade, têm também natureza essencialmente axiológica e dinâmica. No entanto, pode-se afirmar que existe um conjunto de princípios contemporâneos de intervenção que é preconizado por grande parte dos estudiosos e organizações de patrimônio que lidam com o tema, ou talvez por sua maioria – e que determina o que entendem como processos de restauração, reabilitação e requalificação dotados de excelência. Esse conjunto de princípios é de natureza qualitativa, exige a análise e crítica de caso a caso, pode ou não ser aplicado em sua totalidade, não consiste em uma panaceia e não prescinde, quando de sua aplicação, dos conhecimentos, habilidades e competências de todos os envolvidos e, em particular, dos profissionais responsáveis pelos projetos e obras.
Conforme sistematiza Tofani (2020), os mais importantes princípios que constituem esse conjunto e pautam processos de restauração, reabilitação e requalificação considerados como de excelência são: i) visar à preservação e uso sustentável do bem; ii) ser interdisciplinar e documentar todo o processo; iii) salvaguardar a unidade potencial do bem, ou seja, seus principais atributos físicos e simbólicos; iv) realizar o preenchimento de lacunas, ou seja, a reintegração de elementos faltantes da unidade potencial, se forem minoritários e conhecidos; v) não reconstruir ruínas, mas realizar anastiloses e obras de consolidação que cessem ou minorem o arruinamento; vi) reconhecer como válidas as intervenções realizadas no bem ao longo de sua existência e as eliminar apenas em situações excepcionais; vii) priorizar os sistemas construtivos originais, mas empregar sistemas modernos quando mais adequados para a conservação do bem; viii) realizar eventuais adaptações no bem adotando os princípios de distinguibilidade, de dialogismo, de coadjuvação e de reversibilidade ou retratabilidade; ix) respeitar as relações de interdependência e indissociabilidade do bem; x) não decidir sozinho, ser democrático e adotar processos decisórios participativos, qualificados tecnicamente e pautados pela alteridade.
Conceituadas a restauração, a reabilitação e a requalificação e apresentados alguns de seus princípios contemporâneos, é importante reiterar que essas três categorias de intervenção devem ser entendidas fundamentalmente como processos e enfatizar que, no âmbito das arquiteturas vernáculas, elas devem endereçar não apenas os atributos físicos e simbólicos dessas arquiteturas, mas, antes de tudo, os processos de sua produção. Em outras palavras, a restauração de uma arquitetura vernácula, de modo a restabelecer sua matéria a um estado anterior conhecido, pode exigir, antes de tudo, a restauração do todo ou de parte de seu processo produtivo. Já a reabilitação de uma arquitetura vernácula, de modo a potencializar seu uso atual ou restabelecer e potencializar um uso anterior, e a requalificação de uma arquitetura vernácula, de modo a dotá-la de um uso ou funcionalidade que ela jamais teve, podem exigir não apenas a adequação de seus atributos espaciais, materiais e/ou infraestruturais, mas, antes de tudo, a adequação do todo ou de parte de seu processo produtivo.
10. Da alteridade e suas dimensões
Por fim, dentre os entendimentos teóricos e empíricos basilares que predominam hoje na conservação de bens patrimoniais, destaca-se o que preconiza a atitude mais fundamental que deve ter quem se dedica a ela.
Essa atitude deriva de um sublime entendimento que é comungado pelos grandes humanistas de todos os tempos, lugares e culturas, e que reconhece que um encontro com um outro cultural, de modo a atingir a sua plenitude, deve consistir em uma experiência com duas dimensões e uma essência: uma dimensão horizontal, objetiva, dada pelo deslocamento no espaço e no tempo que possibilita nos pormos diante do outro; uma dimensão vertical, subjetiva, dada pelo deslocamento existencial, transcendente, que advém da compreensão desse outro; e uma essência a que se denomina, com justiça, alteridade.
Todo encontro com um outro cultural, assim como a busca pela conservação de um bem patrimonial, de modo a serem plenos, devem ser, em essência, um exercício de alteridade. Ou como escreveu Jacques Brosse (1987, p. 5) em um sensível ensaio síntese sobre os grandes viajantes de outrora, “esta é a moral de todas as viagens. Só são bem-sucedidas se o viajante, que partiu em busca do Outro, chega a se identificar com ele”.
Este conjunto de entendimentos contemporâneos sobre patrimônios e conservação, cabe-nos esclarecer, não tem qualquer pretensão dogmática e é assim sistematizado, em dez tópicos com o referido escopo, em razão de como temos identificado, documentado, desenvolvido, transmitido e aplicado tais entendimentos. Portanto, outras sistematizações são possíveis e podem conter diferente número de tópicos, com diferentes escopos e diferentes ênfases.
Ademais, conforme sempre finalizamos a apresentação desses entendimentos, convém lembrarmos de uma das paródias que compõem o filme de comédia The History of The World: Part 1, escrito, dirigido e protagonizado por Mel Brooks (1926-), narrado por Orson Wells (1915-1985) e lançado nos cinemas em 1981. Essa paródia versa sobre a passagem bíblica na qual o profeta Moisés recebe de Javé, Deus de Israel, as Tábuas da Lei contendo os mandamentos divinos. Entretanto, contrariando a tradição das religiões abraâmicas, Moisés recebe não apenas duas tábuas contendo cinco mandamentos cada, mas três tábuas. Tendo-as em mãos, Moisés retorna a seu povo para divulgar os mandamentos, mas, por descuido, destrói uma das tábuas. Buscando ocultar tal perda e sua responsabilidade por ela, Moisés divulga, então, os dez mandamentos restantes e oculta a existência de mais cinco.
Enfim, por esse meio heterodoxo, reconhecemos a incompletude dos entendimentos contemporâneos sobre patrimônios e conservação – e convidamos a quem se interesse por eles tanto a seu uso crítico quanto a sua ampliação e aprofundamento.
HISTORY of the World: Part 1, THE. Direção de Mel Brooks, 1981. (1h32min).
MUÑOZ VIÑAS, Salvador. Teoria Contemporanea de la Restauración. Madri: Editorial Sintesis, 2004.
REZENDE, Marco Antônio Penido de; TOFANI, Frederico de Paula; CABRAL, Mariana Petry; BRUSADIN, Leandro Benedini. Arquitetura vernácula: construindo uma abordagem interdisciplinar. In: SANT'ANNA, Marcia; REZENDE, Marco Antônio Penido de (org.). Olhares contemporâneos sobre arquitetura vernácula/popular. Salvador: EDUFBA; Belo Horizonte: Editora UFMG, 2022. p. 75-96.
ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
TOFANI, Frederico de Paula. Conjunto Histórico e Paisagístico da Serra da Calçada: contribuições primeiras para sua preservação e uso sustentável. Belo Horizonte: Programa Patrimônios Culturais e Naturais na Serra da Moeda, Minas Gerais (UFMG), 2024. 80 p.